O Projeto

“Osasco tá aqui ó, também tem Osasco nesse mapa aqui”. “Nossa não tem parque aqui, né? Só tem casas”.“No Butantã tem bem mais”. “Somos privilegiados em área verde no Butantã”

Cartografia interdisciplinar no território do Butantã: fortalecimento de redes solidárias a partir do Ponto de Economia Solidária e Cultura da região

O projeto teve como objetivo principal contribuir para a difusão dos princípios da Economia Solidária e para a preservação da memória e da cultura local a partir de ações planejadas e desenvolvidas em parceria com o “Ponto de Economia Solidária e de Cultura do Butantã”. Buscamos realizar de forma articulada atividades de promoção de enraizamento territorial e de apoio à viabilidade de empreendimentos solidários constituídos por usuários da rede de saúde mental e/ou outros segmentos em desvantagem social. 

Esta proposta integra o Programa Aprender na Comunidade, vinculado à Pró-Reitoria de Graduação da Universidade de São Paulo, cujo objetivo é estimular processos de aprendizagem dos estudantes da USP por meio de experiências práticas fora dos muros da universidade. Dessa forma, todas as ações contaram com a ajuda e envolvimento de diversos estudantes da universidade e foram planejadas em coordenação com disciplinas de graduação e pós-graduação das unidades envolvidas no projeto.

O principal parceiro deste projeto, o Ponto de Economia Solidária e Cultura do Butantã, é um equipamento do SUS vinculado à Rede de Atenção Psicossocial da região Oeste do município de São Paulo, e tem como objetivo articular projetos de economia solidária, projetos de cultura e ações de promoção de saúde mental. Atualmente, desenvolve atividades de incubação e apoio à empreendimentos de usuários da rede de saúde mental, cursos de formação em economia solidária e também promove a articulação de redes de trocas econômicas e culturais solidárias na região. Estas ações, no seu conjunto, buscam estimular a construção de uma rede comunitária para enfrentar situações de vulnerabilidade no território e para aumentar a autonomia dos participantes dos empreendimentos solidários, articulando assim práticas de promoção de saúde mental e novas formas de habitação do território. 

As entrevistas realizadas ao longo deste projeto com vários agentes envolvidos na construção do Ponto (usuários da rede de saúde mental, técnicos da prefeitura e professores universitários) revelaram que a história do equipamento está ancorada numa luta histórica do movimento antimanicomial. A história do Ponto está enraizada nas iniciativas que nasceram nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) de São Paulo para geração de trabalho e renda para os usuários dos equipamentos da saúde mental a partir dos princípios da economia solidária, como forma de promover a garantia de direitos e de inclusão social. Essas iniciativas se organizaram em torno da rede de saúde mental e economia solidária, com braços regionais na cidade, responsáveis por organizar as iniciativas locais e o movimento como um todo. A maneira como essa luta se articula com a criação de políticas públicas e a repercussão desse projeto para os usuários da rede, principalmente para aqueles envolvidos nos projetos de geração de renda, foram temas explorados nas entrevistas realizadas e permitiram compreender melhor essa história, suas repercussões e possibilidades de desenvolvimento.

O Ponto foi inaugurado em março de 2016, e desde o início de seu funcionamento, acolheu diversas atividades de estágio e de extensão universitária elaboradas por distintas unidades da USP. Essas experiências iniciais apoiaram uma reflexão sobre as possibilidades de participação da comunidade acadêmica no desenvolvimento de ações em parceria com o Ponto e serviram de base para a construção do atual projeto. 

Desta forma, buscamos aproveitar as experiências anteriores que se desenvolviam a partir de áreas de conhecimento específicas para criar um projeto interdisciplinar articulando ensino, pesquisa e extensão. O objetivo inicial foi conhecer mais a fundo a rede de atividades culturais e de empreendimentos solidários no território do Butantã, tomando como ponto de partida e eixo articulador o Ponto de Economia Solidária e Cultura do Butantã. À medida em que conhecíamos essa rede, tentamos organizar atividades que pudessem aumentar sua visibilidade e estimular a cooperação entre eles.

Pensamos que esse objetivo poderia ser alcançado a partir de uma cartografia da região, mapeando as iniciativas que pudessem se articular no projeto, apoiando uma visão mais ampla e integrada sobre o território e a política de saúde.   O processo se desenvolveu por meio de um conjunto de atividades: oficinas com a comunidade, entrevistas com representantes do saber acadêmico e popular, viagem guiada para conhecer a cadeia de produção dos produtos orgânicos, entre outras. Estas atividades também tiveram como objetivo articular o conhecimento acadêmico e popular produzido sobre o bairro do Butantã, e a partir dos resultados das oficinas, resgatar, ampliar e divulgar a memória local e ao mesmo tempo fortalecer os espaços de participação social.  Pensamos a cartografia social como estratégia para capturar e representar os processos sociais e o cotidiano da vida coletiva, de indivíduos e de grupos sociais para representar o cotidiano de uma comunidade que se coloca partícipe das ações, atividades e mapeamentos, articulando saberes e conhecimentos legitimados pela realidade social e pelo enraizamento territorial.

Desde o início, procuramos planejar e realizar as atividades em diálogo também com outros parceiros do Ponto. Várias reuniões foram realizadas com a participação da equipe da Universidade, do Ponto e representantes da Rede Butantã de Entidades e Forças Sociais. Isso nos levou a apresentar a proposta em algumas reuniões da Rede, a elaborar um questionário para conhecer melhor os movimentos sociais ali reunidos e a contar com ajuda deles também no planejamento e divulgação das oficinas. Como resultado desta colaboração, construímos um mapa que permite visualizar a distribuição territorial de uma parte de seus integrantes e conhecer suas áreas de atuação. A oficina Lutos e Lutas foi planejada e realizada em parceria com o Instituto Herzog e fez parte de um evento planejado por essa instituição que ocorreu no Ponto.

O projeto compartilha ações, saberes e trocas de áreas de conhecimento que se dedicam a pensar práticas de promoção de saúde mental, de produção e apropriação do espaço (Terapia Ocupacional, Psicologia e Arquitetura e Urbanismo) e do conhecimento popular, através de uma comunicação dialógica entre saberes acadêmicos de diferentes disciplinas e populares. Para se estabelecer o diálogo entre diferentes as áreas disciplinares e saberes populares algumas perguntas nos guiaram. Como dar sentido a territorialização de ações e das atividades para ir além de um mapeamento como instrumento técnico e informativo? Como compreender e territorializar o movimento da sociedade, suas lutas e vontades? Como fazer que esse material apoie projetos e encaminhamentos de ações coletivas? O que seria o ‘território do Butantã’ visto através da perspectiva do Ponto? Esperamos que os resultados apresentados neste site possam servir como uma contribuição a este importante debate realizado tanto pela comunidade, como pelos movimentos sociais e pela comunidade acadêmica

Estes objetivos em seu conjunto estão ligados a um duplo mergulho (acadêmico e popular), um encontro entre aprendizagem e participação que leva as pessoas a gerarem conhecimento, aprenderem e transformarem sua localidade. Para os alunos da USP, a possibilidade de conhecer e vivenciar a história local (urbana e social), as memórias de situações de respeito e desrespeito e as atuais dinâmicas socioterritoriais do bairro; para a comunidade Butantã, preservar sua história local e imergir nas dinâmicas socioterritoriais para ampliar sua capacidade e autonomia na participação e ação comunitária. 

Esperamos que este site seja de alguma forma uma contribuição para a criação de um acervo histórico local e um estímulo para a continuidade de atividades que busquem valorizar a cultura e a memória da região, e que tenham como objetivo fortalecer os vínculos de cooperação entre iniciativas econômicas e culturais promotoras de saúde e enraizamento.